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Tese diferente que discute a exigência de 10% do FGTS foi aceita pelo TRF5

A Lei Complementar nº 110/2001 instituiu no artigo 1º, a contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de 10% (dez por cento) sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas.

Sob o entendimento de que a exigência era inconstitucional, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Partido Social Liberal (PSL) ajuizaram duas ADINs (nºs 2.556-2 e 2.568-5 respectivamente) objetivando afastar a contribuição. Nessas ações os autores alegaram que a contribuição criada pela LC nº 110/01 era inconstitucional, porque não se destinava ao custeio da seguridade social, à intervenção no domínio econômico ou atender interesse de categorias profissionais, conforme exigiam os arts. 149 e 195, §4º, da CF/88.

As ADINs foram julgadas parcialmente procedentes pelo plenário do STF em 13.06.2012, que reconheceu a constitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar nº 110/2001, desde que respeitado o prazo de anterioridade para início da exigibilidade (art. 150, III, “b”, da CF).

No julgamento o STF apreciou alguns temas, tais como: (a) a legitimidade da finalidade da criação da contribuição; (b) a não aplicação das limitações constantes nos arts. 157, II, e 167, IV e 195 da CF à referida contribuição; (c) a não existência de violação ao art. 10, I, do ADCT, pois a contribuição não se confunde com a contribuição devida ao FGTS; e (d) a pertinência entre os contribuintes escolhidos, os empregadores, e a finalidade do tributo. No entanto, o STF ressalvou o exame da alegada inconstitucionalidade superveniente em razão do atendimento da finalidade do tributo.

Em vista disso, os contribuintes passaram a discutir a questão do exaurimento da finalidade da multa de 10% do FGTS. Atualmente a questão está aguardando julgamento com repercussão geral reconhecida no STF, conforme ementa:

“CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – ARTIGO 1º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 110/2001 – FINALIDADE EXAURIDA – ARTIGOS 149 E 154, INCISO I, DA CARTA DE 1988 – ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa a saber se, constatado o exaurimento do objetivo – custeio dos expurgos inflacionários das contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – em razão do qual foi instituída a contribuição social versada no artigo 1º da Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, deve ser assentada a extinção do tributo ou admitida a perpetuação da cobrança ainda que o produto da arrecadação seja destinado a fim diverso do original”. (RE 878313 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 03/09/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 21-09-2015 PUBLIC 22-09-2015).

Além disso, posteriormente foram ajuizadas outras três ações diretas de Inconstitucionalidade (nº 5050, nº 5051 e nº 5053). Nessas ADIs se questiona a contribuição sob outros três fundamentos que não foram apreciados pelo STF, quais sejam: (i) o exaurimento de validade da referida contribuição pelo atingimento do objeto financeiro; (ii) que o destino das contribuições vinculadas tem sido desviad,; pois ao invés de ser incorporado ao FGTS, é destinado para o reforço do superávit primário, por intermédio da retenção da União, além de ser utilizado para financiar outras despesas estatais, como o Programa Minha Casa Minha Vida; e (iii) porque com o a advento da EC 33/01, que fixou novas bases de cálculo às contribuições de intervenção ao domínio econômico, a contribuição de 10% do FGTS tornou-se incompatível com a CF, pois sua base é diferente das novas bases econômicas acrescidas pela superveniente EC 33/01, que incluiu o § 2º, III, “a”, no art. 149 da CF/88.

Nesse ponto, cabe lembrar que é possível a rediscussão da constitucionalidade de norma declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, pois baseada em alteração importante da CF posterior.

Pois bem, os argumentos (i) e (ii) são bem conhecidos e muito abordadas tanto nas ações judiciais, como em noticiários jurídicos. Por outro lado, a questão (iii) é menos divulgada, mas a que tem maior chance de ser provida, no nosso entendimento.

Trata-se do seguinte. A EC nº 33/01 incluiu o § 2º, III, “a”, no art. 149 da CF/88, que dispõe que as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico “poderão ter alíquotas ad valorem tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro”.

Note-se que o STF já decidiu que as bases de cálculo previstas no art. 149, § 2º, III, são taxativas. Isso se destacou quando do julgamento do RE – 559937, que tratou do PIS e COFINS incidentes sobre a importação e sua base de cálculo.

Ocorre que, a base de cálculo da contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, é o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas e, portanto, não guarda qualquer relação com as bases de cálculo admitidas pela CF na redação da EC 33/01, quais sejam, o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação.

Assim, com a edição da EC 33/01, foi revogado o 1º da LC nº 110/2001, pois há antinomia entre as duas normas. De fato, por força da Emenda 33/01 o artigo 1º da LC 110/2001 se tornou incompatível com a CF/88.

Nesse sentido a jurisprudência do STF:

“EMENTA: (…)1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal – malgrado o dissenso do Relator – que a antinomia entre norma ordinária anterior e a Constituição superveniente se resolve em mera revogação da primeira, a cuja declaração não se presta a ação direta. 2. O mesmo raciocínio é aplicado quando, por força de emenda à Constituição, a lei ordinária ou complementar anterior se torna incompatível com o texto constitucional modificado: precedentes”. (ADI 3569, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 02/04/2007, DJe-013 DIVULG 10-05-2007 PUBLIC 11-05-2007 DJ 11-05-2007 PP-00047 EMENT VOL-02275-01 PP-00160 LEXSTF v. 29, n. 342, 2007, p. 96-105)

Pois bem, com base nesses fundamentos, no final do ano passado, o TRF5 eximiu o contribuinte da obrigação de recolher a contribuição social de 10% sobre os depósitos feitos nas contas vinculadas ao FGTS durante a vigência do contrato de trabalho, instituída pelo art. 1º da LC 110/01, tendo em vista a sua não recepção pela CF/88 a partir da EC 33/01; e reconheceu o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos 5 anos.

Eis a ementa do julgado:

“CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL DE 10% INCIDENTE SOBRE O FGTS. ART. 1º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 110/2001. INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE. ART. 149, PARÁGRAFO 2º, III, “a” da CF/88, COM A REDAÇÃO DA EC 33/2001. ROL TAXATIVO DE BASE ECONÔMICA PARA INCIDÊNCIA DA EXAÇÃO. COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE.

Apelação interposta pelos impetrantes, em adversidade à sentença proferida pelo Juízo da 21ª VARA FEDERAL PE que denegou a segurança pleiteada no sentido de ter assegurado o direito ao não recolhimento da contribuição social geral destinada ao custeio do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, instituída pelo art. 1º da Lei Complementar nº 110/2001, devida pelo empregador em casos de despedida sem justa causa dos seus empregados.
Pretensão recursal consubstanciada na inexigibilidade das contribuições em questão, bem assim na compensação ou restituição dos valores recolhidos indevidamente nos 05 (cinco) anos anteriores à propositura da ação.
Questão posta nos autos se refere a possível incompatibilidade constitucional superveniente das contribuições já instituídas por lei, como é o caso da Contribuição Adicional ao FGTS, antes das modificações introduzidas pela Emenda Constitucional n. 33/2001.
Não há óbice à apreciação da presente apelação. Embora haja recurso com repercussão geral reconhecida (RE nº 603.624 – Tema nº 325) ainda pendente de julgamento, o respectivo relator não determinou o sobrestamento dos processos que tratam da matéria afetada.
Em se tratando de contribuições sociais gerais e de intervenção no domínio econômico instituídas por lei antes da introdução, por intermédio da EC 33/01, do parágrafo 2º e seus incisos ao art. 149 da CRFB, é induvidoso que a superveniência da referida emenda constitucional implicou a não recepção, a partir de então, das legislações pretéritas que tenham fixado bases de cálculo diferentes das novas bases econômicas acrescidas ao referido dispositivo da CF/88 em 11.12.2001, data da entrada em vigor da EC 33.
A recepção e a manutenção na ordem jurídica das leis pretéritas à CF/88 não pressupõem apenas que os seus respectivos textos sejam compatíveis com o conteúdo da Constituição no momento de sua promulgação, mas também que com ele permaneçam conforme, inclusive no que se refere às futuras alterações de conteúdo implementadas pelas subsequentes emendas constitucionais, notadamente em se tratando de constituição de natureza analítica.
Na situação dos autos, em relação a contribuição social geral destinada ao custeio do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, vê-se que a legislação que a instituiu (art. 1º da Lei Complementar nº 110, de 11/06/2001 -anterior, portanto, à EC 33, de 11/12/2001) passou a colidir frontalmente, após a EC 33/01, com o rol taxativo do parágrafo 2º, III, “a”, do art. 149 da CF/88.
Como as alíquotas ad valorem das contribuições para o FGTS incidem sobre o “montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescidos das remunerações aplicáveis às contas vinculadas” e “remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas as parcelas de que trata o art. 15 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990”, tais exações também passaram a ofender, a partir da EC 33/01, o rol taxativo do parágrafo 2º, III, “a”, do art. 149 da CF/88, visto que incidem sobre bases econômicas distintas das ali previstas.
Com a superveniência da EC 33, a qual introduziu novas bases econômicas (materialidades) passíveis de tributação a título de contribuição sociais gerais e de intervenção no domínio econômico no parágrafo 2º, inciso III, alínea “a”, do art. 149 da CF/88 (faturamento, receita bruta ou o valor da operação), ESTÃO REVOGADAS, porque não foram recepcionadas, as contribuições que incidem sobre outras bases de cálculo distintas daquelas fixadas no mencionado rol taxativo.
Quanto ao pedido de compensação, aplicável analogicamente ao presente caso, o Colendo STJ, no REsp 1.111.164/BA, julgado sob o regime de recursos repetitivos, assentou o entendimento de que em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, a compensação de valores pagos indevidamente será realizada pelo próprio contribuinte sob a fiscalização das autoridades administrativas. Contudo, para que seja concedida a segurança e declarado o direito à compensação deve-se demonstrar, de plano, que houve o recolhimento indevido ou a maior. Entretanto, o mesmo julgado prevê a possibilidade de ser reconhecida à compensabilidade, ou seja, a possibilidade de compensar eventuais créditos em face da Fazenda Pública. Esse é o procedimento mais adequado para o caso sub examinen, devendo ser assegurado ao contribuinte tão somente a compensabilidade dos valores recolhidos de forma indevida.
Destaque-se que os critérios a serem utilizados na futura compensação (SELIC, restrição a créditos da mesma natureza, prescrição…), somente deverão ser analisados oportunamente, na seara administrativa ou judicial.
Apelação parcialmente provida para conceder, em parte, a segurança requestada, a fim de: (I) eximir a impetrante da obrigação de recolher a contribuição social de 10% sobre os depósitos feitos nas contas vinculadas ao FGTS durante a vigência do contrato de trabalho, instituída pelo art. 1º da LC 110/01, tendo em vista a sua não recepção pela CF/88 a partir da EC 33/01; e (II) reconhecer o direito à compensabilidade dos valores recolhidos indevidamente nos últimos 5 anos.
(Número do Processo: 08072143220184058300, Data do Julgamento: 17/12/2018, Órgão Julgador: 4ª Turma do TRF5, Relator: Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto)