Fisco diz que troca de terreno entra no imposto de incorporadora média
Entendimento publicado pela Receita Federal prejudica exclusivamente as empresas de menor porte do segmento imobiliário. Projeção de especialista é que custo inicial dos projetos suba
São Paulo - Um entendimento oficial da Receita Federal deve garantir às incorporadoras de médio porte uma antecipação ou até aumento de impostos. Na visão do Fisco, se a empresa promete apartamentos em troca do terreno, a propriedade deve entrar no cálculo do imposto. A medida foi anunciada por meio do Parecer Normativo 9/2014 da Receita Federal. Apesar de não ter força de lei, o documento estabelece a interpretação oficial a ser adotada pelos fiscais federais.Para as empresas, isso resulta em maior chance de autuações, inclusive sobre transações dos últimos cinco anos.
A interpretação contida no parecer trata apenas da tributação de empresas do ramo imobiliário que optaram pelo regime fiscal de lucro presumido, cujo teto de faturamento é R$ 78 milhões. Ou seja, afeta só as incorporadoras de menor porte. Acima desse limite de faturamento, as empresas apuram impostos no regime de lucro real. Nesse caso, a lei diz que a troca de imóveis não deve entrar na base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) . Apesar de o regime de lucro presumido trazer benefícios fiscais em relação ao de lucro real, o caso da permuta de imóveis mostra o oposto. Nas estimativas da PLKC Advogados, um terreno recebido por uma incorporadora de médio porte por R$ 10 milhões, por exemplo, precisaria arcar com uma alíquota de 6,73% de imposto, o que equivale a R$ 673 mil em impostos. A interpretação do Fisco considera que este terreno recebido pela incorporadora, numa situação de troca, faria parte na verdade de uma transação de compra e venda. Com isso, deveria entrar na receita bruta da empresa. Só que na prática não houve ganho em dinheiro. "Quer dizer, antes de colocar um tijolo, estou pagando imposto", diz o tributarista Rafael Palma Bifano, do PLKC.
O sócio do mesmo escritório de advocacia, Osmar Marsilli Junior, acrescenta que a tributação ocorre num momento complicado para a empresa, afinal a construção do imóvel nem começou. "É um período em que não há receita. Ou seja, acaba aumentando o custo inicial do empreendimento."
Marsilli destaca que o benefício da permuta de imóveis não é a redução do imposto. Afinal, no momento da venda da unidade habitacional, pelo valor de mercado, o preço final do apartamento incorpora o valor do terreno. "A rigor, a permuta é uma espécie de adiamento da tributação."
Histórico
Antes, as empresas do ramo imobiliário eram obrigadas a apurar o imposto de renda por meio do regime de lucro real. Contudo, em novembro de 1998, mudança na lei permitiu a adesão ao lucro presumido.
No entanto, a instrução normativa 107/1998 da Receita Federal, que trata das permutas, havia sido publicada meses antes. Com isso as empresas que adotam o regime de lucro presumido não foram incluídas. "Quando surgiu o lucro presumido, as pessoas continuaram adotando o mesmo conceito do lucro real. Mas agora a Receita está dizendo que não", conta Verônica Sprangim, sócia da Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados.
Regra
A norma 107, válida apenas para o regime de lucro real, diz que "no caso de permuta sem pagamento de torna, as permutantes não terão resultado a apurar". Em outras palavras, se houve apenas a troca de imóveis, sem contrapartida em dinheiro (torna), a transação não deve entrar no cálculo fiscal.
Mesmo assim, no entendimento da Receita Federal, o benefício fiscal vale apenas para as empresas que adotam o regime de lucro real. O Fisco baseia seu entendimento no Código Civil, cujo artigo 533 diz que "aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda". Com isso, o órgão conclui que incide a permuta de imóveis compõe a base de cálculo do IRPJ e CSLL.
Verônica destaca que o parecer normativo "indica o que a Receita pensa, mas não tem força de lei". Com isso, contestações no âmbito administrativo ficam mais difíceis. Na Justiça, afirma a tributarista, o assunto "começa agora".
Por Roberto Dumke