Monitoramento de funcionários em home office cresce e gera discórdia
No início da pandemia da Covid-19, quando os funcionários começaram a trabalhar remotamente, os empregadores se apressaram para instalar sistemas de monitoramento para monitorá-los.
No entanto, pesquisas alertam que esses programas de monitoramento podem tornar os funcionários menos produtivos.
A fiscalização ganhou popularidade durante os primeiros “lockdowns”, com os empresários tentando controlar os colaboradores, que eles temiam estar em casa não cumprindo o horário de trabalho.
Ao utilizar ferramentas de software para monitorar quando os colaboradores estavam usando seus computadores, o tempo que passavam em sites e com quem estavam trocando mensagens, os empregadores alegaram que podiam garantir que os funcionários estariam conectados ao seu trabalho e uns aos outros.
Porém, empregados e pesquisadores acadêmicos agora afirmam que esses sistemas são mais propensos a degradar a cultura corporativa ao invés de aumentar a eficiência.
De acordo com estudo publicado no “Journal of Management”, os trabalhadores americanos que sabem estar sendo monitorados digitalmente tendem a fazer mais pausas e trabalhar mais devagar do que colegas que trabalham de forma independente.
“A promessa desses sistemas é que eles treinam os funcionários para serem mais eficientes”, diz a professora de ciência da informação da Universidade Cornell, dos Estados Unidos, Karen Levy.
No entanto, Levy explica ainda que muitas dessas ferramentas não criam de fato eficiência, transferindo parte da ineficiência dos trabalhadores ao fazê-los se preocupar sobre quanto tempo ficam no banheiro.
Como é o que os empregadores monitoram varia muito. Algumas empresas usam registradores de teclados para rastrear o quanto os funcionários digitam, enquanto outras usam as câmeras embutidas de seus laptops para monitorar expressões faciais.
Além disso, outra tecnologia remota faz capturas de telas dos monitores dos funcionários, enquanto softwares de bate-papo como o Slack podem ser usados para descobrir com quem um determinado funcionário fala mais.
Os fornecedores dessas ferramentas afirmam que essas tecnologias podem proporcionar aos executivos informações importantes sobre suas equipes.
Análises de dados poderiam revelar quais funcionários são mais cruciais para as operações, flagrar aqueles que planejam fraudar a companhia, alertar se um funcionário está socialmente isolado e até mesmo prever quando um empregado começa a pensar em mudar de emprego.
Porém em seu estudo sobre caminhoneiros que percorrem longas distâncias e que foram monitorados com sensores a bordo e câmeras em suas cabines, a professora Levy constatou que eles tiveram mais acidentes do que os caminhoneiros que não estavam sendo observados.
O problema, diz a professora, é que os aspectos do desempenho de um caminhoneiro que podem ser facilmente medidos, consumo de combustível, frequências das frenagens e tremores nos olhos, são diferentes daqueles que na verdade os tornam motoristas seguros.
“Muitas vezes vemos as pessoas usando meios imperfeitos para monitorar os funcionários”, observa Levy. “Mais difícil é medir a criatividade.”
O mesmo provavelmente vale para os trabalhadores de colarinho branco, acrescenta a professora. Um sistema que recompensa o gerente de contas que envia mais e-mails pode levar os funcionários a enviar mais mensagens de baixa qualidade, em vez de menos mensagens mais pensadas que resultem em mais vendas, explica ela.
Ainda assim, tais constatações não impediram as empresas de implementar sistemas de monitoramento.
O número de grandes empregadores que usam ferramentas para monitorar funcionários dobrou entre 2020 e 2022, segundo uma pesquisa da consultoria Gartner.
No ano de 2022, 60% dos empregadores monitoravam seus funcionários e esse número deverá aumentar para 70% nos próximos três anos.
Enquanto conceito, isso não é novidade: os empregadores vêm vigiando seus funcionários há décadas.
Mais recentemente, o monitoramento digital tornou-se comum em locais de trabalho de baixa renda, esta é uma das principais queixas nas negociações sindicais dos trabalhadores dos depósitos da Amazon e motoristas da UPS, empresa de entregas, nos Estados Unidos
Grupos de serviços financeiros e companhias de transporte usam softwares de monitoramento para assegurar a conformidade regulatória.
Mas a crise da Covid-19 levou a uma explosão da “paranoia com a produtividade” no mundo corporativo. Cerca de 85% dos líderes empresariais consultados pela Microsoft afirmaram que a mudança para o trabalho híbrido tornou difícil confiar na produtividade da equipe.
A resposta dos colaboradores foi quase que totalmente negativa. No Twitter e no TikTok, trabalhadores remotos irritados trocam dicas sobre como enganar o chamado “tattleware” , apelido para software de vigilância.
Uma tática comum é comprar um “mouse jiggler”, software usado para simular os movimentos de um mouse, mecânico de US$ 30 para evitar que o laptop pareça inativo.
Outros recomendam usar o mecanismo de envio agendado do Gmail, para que pareça que você está mandando e-mails ao longo do dia.
Os democratas do Senado americano apresentaram uma proposta de lei destinada a forçar as organizações a revelar as informações que elas recolhem sobre seus funcionários e a vigilância que realizam sobre o uso dos dispositivos pelos empregados após o horário do expediente..
Os empregadores que usam esses softwares e as companhias que os produzem, no entanto, afirmam que os trabalhadores deveriam receber bem o monitoramento, porque eles podem usar os dados de desempenho a seu favor.
Existem maneiras pelas quais os empregadores podem tornar a vigilância mais eficaz, diz a professora do Tippie College of Business da Universidade de Iowa (EUA), Jennifer Nahrgang.
As ferramentas de monitoramento melhoram a produtividade quando são usadas para fornecer aos funcionários um feedback de desenvolvimento sobre as tarefas que eles executam naturalmente, mas não exigem mudanças nos padrões naturais de trabalho, afirma.
Os colaboradores também são menos propensos a tentar burlar o sistema quando podem opinar sobre como ele é estabelecido, diz Nahrgang.
“Se as ferramentas de vigilância são usadas para controlar, elas tiram a autonomia do funcionário, que é um dos indicadores mais fortes da satisfação no trabalho e do desempenho”, observa.